Madrugada. Ele acorda em sobressalto. Olha no relógio. Não passaram mais de trinta minutos desde que olhara o relógio pela última vez. Tem sido assim nos últimos tempos. Passa os dias na rua tentando vender algo. Está difícil. Faz anúncios, divulga, de boca a boca, os produtos que tem, quando pensa que irá vender, alguém desiste. Está complicado para todo mundo. O mercado se encolhe. À noite, tenta se distrair, não pensar nos obstáculos enfrentados durante o dia, mas, não tem como não pensar... Recebe ajuda de familiares. Não consegue se sustentar. Ainda bem que tem uma casa, disposição para trabalhar. Não completou os estudos em tempo hábil, apesar de ter estudado em escola particular. Estudou até o antigo ginásio. Só agora, depois de completar cinquenta e cinco anos fez o exame que o habilitou à conclusão do Ensino Médio. Conseguiu até uma oportunidade para frequentar um curso superior, mas tinha que ter recursos para pagar a outra parte que não era custeada pela bolsa. Então, não foi possível entrar na universidade. Não iria sobrecarregar ainda mais os familiares que já o ajudam pagando suas despesas. Seu filho mora em outra cidade, tem três filhos e algumas dificuldades, também. Enfim, não vê saída. Pessoas com dois cursos superiores, mais novas estão desempregadas. E, ele, com cinquenta e oito anos, sem nenhum, só com a cara e a coragem e, suas experiências pessoais, algumas bem sucedidas, outras não. Cheio de sonhos que ainda pretende realizar mesmo estando próximo dos sessenta anos. Em um país que já foi de jovens e que hoje, se encaminha para o envelhecimento, não há lugar para um quase idoso voltar ao mercado de trabalho formal. A insônia prossegue. Levanta. Abre a janela. Olha para o alto como a procurar ajuda. “No céu risonho e límpido, resplandece o Cruzeiro do Sul”. Anima-se. Sente uma ponta de esperança. Talvez as coisas melhorem. Não fugirá à luta. O sol de um novo dia logo irá despontar e, com ele a vontade de mudar, de não arrefecer, de encontrar seu lugar no mundo.
Isabel C S Vargas
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