REMINISCÊNCIAS
Isabel
C S Vargas
Ao
passar por uma padaria senti o cheiro do pão ao sair mais uma fornada. De
imediato fui remetida aos tempos de minha infância. Adoro este aroma.Coisa
curiosa, pois pode parecer que tive uma infância maravilhosa e, no entanto, ela
foi cheia de dificuldades, de carências materiais.
Outra responsável por lembranças é a chuva, ou melhor, o odor que a
terra exala em contato com a água da chuva. Não sei explicar com exatidão
quando isso ocorre, mas creio que é em tempo de calor e de seca.
Sempre
morei em casa. Talvez
por isso, pelo contato mais direto com o solo essa ligação seja explicada.
Ao
lembrar esta época, recordo de uma casa de madeira ao fundo de um grande terreno.
Grama verde, borboletas e cigarras voando na primavera e no verão. Vejo-me
cuidando de minha irmã menor e, no inverno que embranquecia o pasto, ouço meus
intermináveis acessos de tosse. Volta uma grande sensação de impotência. (Ou
quem sabe ela sempre esteve aqui escondida).
Reporto-me
ao nascimento de meu irmão, em épocas mais distantes ainda, da minha felicidade
ao exibi-lo às visitas como se fosse meu bebê e das minhas angústias quando ele
adoeceu e quase se hospitalizou.
O
gatilho de minha infância é detonado quando ouço alguma música esquecida no
tempo. Lili (acho que é esse o nome) é uma delas.
Associo ao passado, as balas de goma, aquelas
ainda sem formas diversas como agora, peito de frango desfiado, balas de guaco,
xarope caseiro feitos por minha avó, cuja folha era colhida direto na planta
que se espalhava por cima da parede do tanque. Ainda, o doce de figo, cujo pé
era possível enxergar da janela de seu quarto.
Na
Páscoa, ovos de açúcar, bem mais acessíveis que os de chocolate; ninhos feitos
em cestos de vime ou caixas cuidadosamente decoradas com franjas de papel de
seda. Uma grande expectativa se
instalava, um grande prazer fazê-los.
Em um
breve insight percebo que isso talvez explique a luta constante contra o
excesso de peso.
Volto
à realidade e percebo o que poderíamos considerar à época como algo
desagradável, o tempo torna doce, carregado de nostalgia, porque junto destas lembranças
estão pessoas que nos foram caras. Apesar do tempo decorrido, permanecem
indeléveis em nossa vida pelos ensinamentos, pelas vivências e pelo amor que
nos uniu.
Publicado no Diário da Manhã-Pelotas-RS
Data:2012.04.05 página 04- Tribuna do Povo
Publicado no site:www.icsvargas.blogspot.com
Marcadores: publicação D.Manhã
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