PENITÊNCIA
Clarinda é uma
mulher bonita. Deve ter uns quarenta e poucos anos.
Estatura mediana,
corpo bem feito, nem gorda ou magra, curvilínea, cabelos bem curtinhos, pele
morena do sol, que ela apanha em sua caminhada diária, por todo lugar, a
qualquer hora, geralmente na área central da cidade.
A boca sempre pintada. Único indício de
sua vaidade. Anda sempre arrumadinha.
Quem a vê circulando pelas ruas da
cidade não imagina que tenha alguma aflição a lhe atormentar a alma. Sua face é
tranqüila.. Talvez possam imaginá-la uma aspirante a atleta em fase de
treinamento intenso pois anda sempre pelo meio da rua. Também pode ser que
precise se exercitar bastante por questões de saúde . Na calçada ninguém a vê nunca.
Seu vai-vem diário tem algumas paradas
com hora e local certo. Nas igrejas,
centrais e em horários de missa.
Chega um pouco mais cedo.Ali ela começa
os preparativos.Não são muitos, mas significativos. Mostram respeito na
indumentária, devoção na face.
Se está de bermudas, veste uma saia
discreta ou uma calça longa.Ali mesmo, na frente do templo..
Antes do início da missa ela coloca um
véu branco que lhe cobre a cabeça, desce pelos ombros e cai até o joelho.
Segura o véu com as mãos que juntas próximo ao peito completam o visual da
Maria que ela carrega dentro de si e expande no olhar em cada reza, canto ou
ato penitencial . No ofertório a oferenda é o sofrimento diário para ver se
tira de cima dos ombros um pouco da dor que leva consigo desde que sua linda
menina de cabelos negros , cheios de cachos que lhe caíam nas costas foi
atropelada por um motorista bêbado que subiu na calçada.É ela que Clarinda coloca nos braços da Virgem toda vez
que se ajoelha lá na frente do altar e estende os braços fervorosamente.
Publicado no livro : Joaquim Monks & amigos- Editora Alternativa
Data:2012.01.20
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