quarta-feira, novembro 03, 2010

                                  
 BARUC, O ABENÇOADO




Baruc é um cão labrador preto. De uma ninhada de 9 filhotes – todos encantadores-, e todos com nome com a letra B, por ser uma segunda cria, ele foi o único que teve problemas após o nascimento. Fez uma peraltice que lhe rendeu muitos problemas. E a nós também.

Dormiam na garagem, onde colocamos um obstáculo para que não passassem daquela área para a churrasqueira. Certa ocasião, ao chegarmos a casa, minha filha e a minha neta já nos esperavam porque o controle não abrira o portão. No fundo  latidos intensos. Fomos de imediato ver o que ocorrera.

Baruc conseguira, com 02 meses de idade, transpor o obstáculo, passar por cima de um engradado de bebidas, que tinha mais uma caixa em cima e ficar de cabeça para baixo, sem cair nem poder voltar, debatendo-se de modo a machucar a para traseira.

Tentávamos tirá-lo dali, mas não conseguíamos pois ele ficara com metade do corpo para trás da geladeira, onde finalmente caiu enquanto tentávamos desobstruir o caminho para chegar até ele. Para completar a travessura, entrou para dentro do local onde fica o motor da geladeira..

Após arredar a geladeira, conseguimos tirá-lo, meio assustado, meio sujo e sangrando. O veterinário, de imediato orientou sobre os procedimentos que foram cumpridos à risca.

Passados uns 03 dias, percebeu-se no lombo dele duas listras brancas paralelas, como se o couro estivesse cortado, enrugado e sem pelo.Fomos direto ao consultório do veterinário. Constatação. Havia uma queimadura feita pelo calor do motor da geladeira. Já começava a aparecer inflamação. A região teve foi raspada e a pele tirada.

Tratamento prescrito para 30 dias, com assepsia, medicação e curativos de manhã, à tarde e à noite. Entretanto, não ficou só na queimadura não. Com a imunidade baixa, apareceu uma enfermidade que o tomou por inteiro. Surgiram bolas enormes de inflamação, que ao estourarem deixavam buracos enormes à vista , por todo o corpo. Perdeu pelo no focinho, ficando o mesmo cheio de cascas. É de difícil cuidado. O tratamento é intenso.

Ele se destacava por três motivos: pelo tamanho -era o maior dos pretos- pela fragilidade que o acometera em virtude da doença e pelo nome forte. De início meu filho o escolheu e para ele passou a ser o Barucão.Durante todo o tratamento ele recebeu atenção diferenciada. Passou a dormir em uma cama, dentro de casa, mais precisamente, dentro do quarto, ora do nosso, ora de meu filho, ao lado de sua cama. Como a cama adquirida não era fofinha, ele passou a ter por cama um travesseiro bem confortável.

Minha filha mais velha que escolhera o nome, chorava com medo que ele não resistisse. O tratamento prolongava-se.

Certa ocasião, entrei no quarto e encontrei meu filho deitado no chão, estendido com a roupa de trabalho, a acariciá-lo e a conversar com ele. Ao levantar os olhos perguntou minha opinião. Disse-lhe que ele ficaria bem. Após a sua saída para o trabalho, fiquei a conversar com Baruc, “ao pé do ouvido”, ou da orelha, como queiram. Resiste! Dizia-lhe. Resiste porque nós te amamos, queremos te ver forte, lindo, nos trazendo muita alegria, e diversão para as crianças que ainda virão.

Era como se eu implorasse para ele não me deixar mal. Afinal, meu marido e eu dizíamos sempre que ele iria ficar bem. Talvez não tão bonito, mas iria sobreviver.

Bem o tempo passou, ele resistiu, venceu a doença. Está forte , chama a atenção pelo tamanho, pelas manchas que ficaram no focinho, mas meu filho, lindo, forte , sadio, maravilhoso, não está mais aqui fisicamente. Não o viu crescer.

Na véspera do acidente, meu filho veio para casa mais cedo e pegou-o no colo. Não conseguiu ficar com ele. Teve que soltá-lo no pátio, pois ele não queria ficar em seu colo e chorava muito. Ninguém entendeu seu comportamento.

Hoje, cada vez que ele percebe que estamos reunidos na cozinha, ele grita desesperadamente para entrar porque sabe que estamos todos juntos. Em outras ocasiões, os outros, estão na garagem e ele está sozinho junto ao portão nos esperando. Enquanto os outros brincam e fazem uma algazarra danada, ele se afasta e fica  encostado na parede, quieto em seu canto.

Nós que não queríamos nenhum cão, estamos com mais cinco, sem saber o que será de nossas vidas -das nossas e dos cães- pois em um momento de fragilidade emocional como o que estamos passando, não tê-los aqui representaria mais tempo livre para pensar, menos ocupação, menos distração e mais foco na dor.

Como sequela da enfermidade, os olhos que ficam avermelhados e as lágrimas que correm, frequentemente – assim como as nossas.

Publicado no Diário da Manhã Pelotas-RS
Data:2010.12.20
Página 04- artigo

Publicado no site:http://www.recantodasletras.com.br/contoscotidianos/3494177
Data:2012.02.12








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