domingo, fevereiro 24, 2013

VARAL DO AMOR





Varal do Brasil - Abril de 2013 - Varal Especial do Amor no.2/20B
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SOBRE O AMOR 

Por  Isabel C. S. Vargas

“Vivemos esperando o dia em que seremos 
melhores, melhores no amor, melhores na dor, 
melhores em tudo.”  (Jota Quest) 

Mesmo que estejamos vivendo no século XXI, que o avanço tecnológico seja uma
marca da época, o ser humano continua com
muitos anseios tal qual o homem de século
passado.
 As angústias, as dores, dúvidas sobre si
mesmo, sobre os relacionamentos ainda passam por corações indecisos. Há uma busca por
novos relacionamentos, numa tentativa de viver mais feliz.
 Segundo o psicanalista Flávio Gikovate o
que muitos buscam hoje é um relacionamento
em moldes diferentes daqueles vividos no passado, no qual ocorria até um processo de despersonalização, geralmente da mulher, onde
um ser sente-se incompleto e vai em busca da
outra metade que o complete. Este ser não vive por si só. Precisa de outro que lhe dê sentido. Ocorre um processo de enquadramento no
projeto masculino, no qual a mulher, muitas vezes perde sua identidade.
 Segundo ele, o fundamental nas relações
atuais é a parceria. Não existe aquele desejo
desenfreado de ter alguém para sentir-se alguém, pois as pessoas aprenderam a viver
mais consigo mesma, respeitando-se mais, por
isto pensam em dividir com o parceiro a sua
vida.
 O fundamento da relação é outro. Não é
mais a dependência. Ambos são seres completos, mas que buscam junto um enriquecimento
maior, na troca de vivências, de sentimentos. É
uma troca prazerosa e geradora de crescimento e fortalecimento da cumplicidade.
 São como companheiros de viagem, nesta trajetória imprevisível que é a vida.
 Esta aproximação é possível entre duas
pessoas inteiras, dois seres únicos, valorizados, pessoas que tem forte individualidade, o
que não se confunde com egoísmo.
 Neste tipo de relacionamento não existe
dominação, nem concessões exageradas.
 Cada um é ímpar, no seu modo de pensar, de agir, que serve para si mesmo e não
para julgar, avaliar ou enquadrar ninguém.
Nem existe a necessidade de “criar” alguém
para se enquadrar num esquema que se ajuste
ao do outro.
 Neste tipo de amor que Gikovate chama
de mais amor, coexistem duas pessoas inteiras, onde há prazer na companhia, aconchego,
respeito.
 O homem muda o mundo e depois sente
necessidade de mudar a si mesmo, para se
adaptar ao novo mundo, daí as mudanças nas
rela- ções.

              Na medida em que a sociedade hoje
não está formada dentro dos parâmetros de
antigamente, que a mulher em grande percentual não depende mais do homem financeiramente, tem profissão, reconhecimento, desaparece aquela relação de necessidade e surge
outra mais espontânea que se caracteriza pelo
desejo de estar junto, desejo de companhia de
partilha entre duas pessoas plenas, mais seguras, mais predispostas a dividir o que pode ser
um fator importante para obtenção de sucesso
na relação.
 Este sem dúvida é um assunto muito interessante, principalmente se levarmos em conta
que todos querem mudar o mundo, mudar o
outro, mas encontram dificuldade em mudar a
própria vida, abrir mão de conceitos já arraigados, verdades próprias, pois toda mudança desestabiliza, ameaça territórios conhecidos e
teoricamente dominados.
 Na realidade o amor se constrói junto com
o indivíduo.
 O amor que temos é o amor que somos.




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LITERATURA
COM

Isabel C. S. Vargas

SÓ MESMO DRUMMOND... 
  
           O texto de Drummond, o grande e maravilhoso que é capaz de extrair poesia de pedra, nos faz pensar, refletir sobre o que fazemos – escrever - por profissão, deleite, necessidade, vocação, ou qualquer que seja o motivo.
 Os meios de comunicação além de informar, formam e transformam pessoas, opini-
ões, comunidade, um país inteiro, se for necessário (quantos já caíram do pedestal, por
interferência dos meios de comunicação), por
força de fatos revelados ou por revelação de
omissões nefastas, tipo aquela de Pilatos, de
quem lavou as mãos, embora elas não estejam limpas.
 Bem, voltando ao mago das palavras...
Para que não fiquemos “cheios de si”, com um
certo ar de importante pelo fato de escrevermos crônicas, de termos a ousadia de publicá-
las e achar que transformamos o mundo, ou
as pessoas, só porque dizemos algo ,ou melhor, nos atrevemos a dar nossa versão sobre
determinado assunto, ou relatar experiências
que nos tocaram e que pode ser do agrado de
alguns leitores é bom dar um lida no que ele
diz sobre o ato de escrever.
Escrever impede a conjugação de tantos outros verbos. Os dedos sobre o teclado,
enquanto lá fora a vida estoura não só em
bombas como também em dádivas de toda
natureza, inclusive a simples claridade da hora, vedada a você, que está de olho na maquininha. O mundo deixa de ser realidade quente
para se reduzir a purê de palavras.
 O que você perde em viver, escrevinhando
sobre a vida. Não apenas o sol, mas tudo que
ele ilumina. Tudo que se faz sem você, porque
com você não é possível contar. Você esperando que os outros vivam, para depois comentá-los com a maior cara-de-pau ("com
isenção de largo espectro", como diria a bula,
se seus escritos fossem produtos medicinais).
Selecionando os retalhos de vida dos outros,
para objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim, como se
fosse deus, rei proprietário do universo, que
escolhe para o seu jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego — às
vezes nem isso... Sim, senhor, que importância a sua: sentado aí, dando sua opinião sobre
a angústia, a revolta, o ridículo, a maluquice
dos homens. Esquecido de que é um deles.
Ah, você participa com palavras? Sua escrita
— por hipótese — transforma a cara das coisas, há capítulos da História devidos à sua
maneira de ajuntar substantivos, adjetivos,
verbos? Mas foram os outros, crédulos, sugestionáveis, que fizeram o acontecimento. Isso
de escrever «O Capital» é uma coisa, derrubar
as estruturas, na raça, é outra. E nem sequer
você escreveu «O Capital». Não é todos os
dias que se mete uma ideia na cabeça do pró-
ximo, por via gramatical. E a regra situa no
mesmo saco escrever e abster-se. Vazio, antes e depois da operação.
Já revelei em outras ocasiões o quanto
gosto de Drummond, do que e como escreve.
Apesar de fazer esta crônica com seu prazeroso texto (há quem diria delicioso, mas sou do
tempo que só se usa delicioso para coisas comestíveis) vou me permitir discordar um pouco
do que ele diz (até para me justificar de aqui
estar).  (Segue)  Varal do Brasil - Abril de 2013 - Varal Especial do Amor no.2/20B
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Todo aquele que se atreve a comentar sobre os fatos do cotidiano, não o faz por ser ou
estar sereno (nem ele próprio), superior, mas por ter sido tocado por tais fatos, por outros textos, por uma palavra numa conversa informal com outrem, por acontecimentos fortuitos, quer de
maneira negativa ou positiva a ponto de não conseguir guardar para si todo o sentimento produzido (alegria, tristeza, inquietação, admiração, indignação) dividindo-o com os leitores. Creio
que conseguimos ter olhos sensíveis para os acontecimentos, (não que outras pessoas não
possuam) por mais banais que possam parecer, só temos a ousadia de dar nossa opinião e de
mostrar de que modo fomos atingidos. Neste processo, muitos se identificam e gostam (nosso
público leitor) outros discordam, e um outro percentual nem foi atingido pelo que escrevemos e
seguem sua vida independente das letrinhas colocadas no papel.  Enquanto isso, como diz o
poeta, um imprevisto sucede outro, num mecanismo de monotonia... explosiva.