quarta-feira, agosto 15, 2012

Revista Eisfluências-Portugal

POESIA EM FORMA DE CONTO

por Isabel C.S.Vargas



Desejo partilhar o encantamento com a leitura de um livro de Mia Couto.
São vinte e nove contos escritos com habilidade e com a magia característica de quem tem o dom de criar palavras
(neologismos) e com elas brincar, tecendo histórias de vidas e de sonhos.
Alguns trechos me faziam lembrar de minha professora de literatura, ao dizer, parafraseando Schopenhauer, que
literatura boa é aquela que não se esgota em uma leitura, mas sim a que a cada leitura descobrimos algo novo. Em
outras me faz lembrar minha amiga Estrella, cujas palavras são sempre envoltas numa aura poética que só aqueles
que veem o mundo com olhos diferentes conseguem transcrever e por isto mesmo são pura magia. Percebem
poesia em cada olhar, em cada momento do cotidiano.
Em meio a comoventes histórias (como a do menino que queria morrer e por isto propôs ao avô trocar de lugar com ele), descobrimos
lições como as que abaixo transcrevo:
-“Criancice é como amor, não se desempenha sozinha. Faltava aos pais serem filhos, juntarem-se miúdos com o miúdo. Faltava aceitarem
despir a idade, desobedecer ao tempo, esquivar-se do corpo e do juízo. Esse é o milagre que um filho oferece – nascermos em outras
vidas”.
Em outro conto sobre a avó que não entendia a viagem do neto para viver em um hotel onde aqueles que o acompanhariam no dia a dia
eram meros desconhecidos, sem saber o nome de quem lhe prepararia o alimento, temos uma visão poética do cotidiano: “Cozinhar é o
mais privado e arriscado ato. No alimento se coloca ternura ou ódio. Na panela se verte tempero ou veneno. Cozinhar não é serviço.
Cozinhar é um modo de amar os outros.”... Para esta avó um país estrangeiro começa onde já não reconhecemos parente.
Sobre o menino que fazia versos e não era compreendido, motivo pelo qual foi levado ao médico como se enfermo fosse retiramos o diálogo abaixo:
Ao ser inquirido pelo doutor sobre se algo lhe doía responde:
-Dói-me a vida, doutor.
-E o que fazes quando te assaltam essas dores?
-O que melhor sei fazer, excelência.
-E o que é?
-É sonhar.


6 | eisFluências Agosto 2012


Na epígrafe deste conto, temos o verso do menino que fazia versos:
De que vale ter voz se só quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar se o que vivo é menor do que o que sonhei?
Nas palavras de Mia Couto percebe-se ritmo, como no primeiro parágrafo do conto Meia culpa, meia
própria culpa:
“Nunca quis. Nem muito, nem parte. Nunca fui eu, nem dona, nem senhora.
Sempre fiquei entre o meio e a metade. Nunca passei de meios caminhos, meios desejos, meia saudade.
Daí o meu nome: Maria Metade.”
De  história  em  história  vamos  descobrindo  encontros  e  desencontros,  dores  e  alegrias,  sonhos  e
realidade,  numa  forma  característica  do  autor,  que  retrata  a  fala  do  homem  da  sua  terra  natal,
Moçambique, revelando entre os erros e acertos de cada personagem a humanidade de todos nós.


Isabel C.S.Vargas
Pelotas/Rio Grande do Sul/BR
www.isabelcsvargas.com.




POESIA DE ISABEL VARGAS
CRIATURAS
Isabel C S Vargas

Olho de minha porta
Vejo a lua escancarada
No céu a reinar.
Majestosa me faz de ti lembrar
Pela grandiosidade
E humildade ao dividir o firmamento.
Foste céu, lua, estrela
À todos encantar
Foste sol ardente, majestoso
A nossa vida aquecer
Foste galáxia de bons sentimentos
A todos envolvendo.
Hoje, magnânimo em sua humildade
Incólume, incorruptível soberano
Vives entre astros, duendes e elementais
Na nobre missão de a todos ajudar.


SE EU FOSSE UM PÁSSARO ...
Isabel C S Vargas


Presa ao meu chão natal
Com raízes solidamente fincadas
Pensei assim permanecer para sempre
Sem almejar nada diverso.
Ventos devastadores arrancaram minhas raízes
Desejei ser um pássaro e,
Por outras terras voar
Em uma ânsia louca de te encontrar
Em teus braços me aninhar
Para juntos voar libertos por toda eternidade.

ONDAS
Isabel C S Vargas

Mar límpido, cristalino
Cada onda que bate em meu peito 
Leva dissabores, retém alegrias 
Descarrega tensões
Armazena prazeres. 
Ensina a cada movimento 
Lições de sabedoria.
Como as ondas
Ora somos pequenos
Outra vez somos gigantes. 
Diverte crianças
Agrada aos adultos
Recupera a energia de idosos
A todos leva felicidade.
No mar somos todos iguais
Para se sentir feliz
Não requer luxo
Só despojamento. 
Não importa a cor,
O credo nem opções políticas, 
Não precisa diploma
Ou conta bancária
Para ser feliz
Basta saber ser humilde
Se entregar ao movimento das ondas
Os seus ditames respeitar
E em seu movimento se deliciar. 
Desfrutando a doce sensação de liberdade






http://ecosdapoesia.org/eisfluencias/eisfluencias_agosto_2012_2_18.pdf